A C Ó R D Ã O

(6ª Turma)

GMKA/lra

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.467/2017. RECLAMANTE.

TRANSCENDÊNCIA

RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. NÃO RECOLHIMENTO DE DEPÓSITOS DE FGTS.

1 – transcendência política quando se constata em exame preliminar o desrespeito da instância recorrida à jurisprudência majoritária, predominante ou prevalecente no TST.

2 – Aconselhável o provimento do agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista, para melhor exame da apontada violação ao artigo 483, alínea "d", da CLT.

3 – Agravo de instrumento a que se dá provimento.

II – RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.467/2017. RECLAMANTE.

TRANSCENDÊNCIA

RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. NÃO RECOLHIMENTO DE DEPÓSITOS DE FGTS.

1 – A falta de recolhimento dos depósitos do FGTS (ou seu recolhimento irregular) configura ato faltoso do empregador, cuja gravidade é suficiente para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do artigo 483, alínea "d", da CLT. Julgados.

2 - Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1000629-30.2019.5.02.0609 , em que é Recorrente ODAIR APARECIDO ALEXANDRE e Recorrido KINGS GOVERNANCA DE SERVICOS EIRELI.

O juízo primeiro de admissibilidade negou seguimento ao recurso de revista, sob o fundamento de que não é viável o seu conhecimento.

A parte interpôs agravo de instrumento, com base no art. 897, b , da CLT.

Contrarrazões não foram apresentadas.

Dispensada a remessa dos autos ao MPT.

É o relatório.

V O T O

I – AGRAVO DE INSTRUMENTO

CONHECIMENTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento.

TRANSCENDÊNCIA

RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. NÃO RECOLHIMENTOS DE DEPÓSITOS DE FGTS.

Há transcendência política quando se constata em exame preliminar o desrespeito da instância recorrida à jurisprudência majoritária, predominante ou prevalecente no TST.

MÉRITO

RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. NÃO RECOLHIMENTOS DE DEPÓSITOS DE FGTS.

O Tribunal Regional, juízo primeiro de admissibilidade do recurso de revista (art. 682, IX, da CLT), denegou-lhe seguimento, sob os seguintes fundamentos:

RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO/RESCISÃO INDIRETA.

Inservíveis os arestos transcritos com vistas a corroborar o dissídio jurisprudencial, porquanto provenientes de Turmas do C. TST, o que não se afina à literalidade do disposto na alínea 'a' do artigo 896 da CLT.

Já o aresto da SDI-1 do TST é inespecíficos ao caso vertente, contrariando o teor da Súmula 296, I, do C. TST, pois não abriga premissa fática idêntica à contida no v. acórdão recorrido, pois o aresto não trata de rescisão indireta pela ausência de recolhimento dos depósitos do FGTS, ou seu recolhimento irregular, mas da admissibilidade de agravo regimental contra embargos declaratórios rejeitados.

Outrossim, de acordo com os fundamentos expostos no acórdão, especialmente que 'a inadimplência dos depósitos do FGTS, único fundamento do pedido de reconhecimento de rescisão indireta julgado procedente, por si só, não constitui motivo justificador de rescisão indireta', não é possível divisarofensa aos dispositivos da Constituição Federal e da legislação federal mencionados no recurso de revista.

DENEGO seguimento.

CONCLUSÃO

DENEGO seguimento ao recurso de revista.

A fim de demonstrar o prequestionamento da matéria controvertida, a parte indicou, nas razões do recurso de revista (fls. 402-404), o seguinte excerto do acórdão do TRT:

"Da Rescisão Indireta. Não se conforma a reclamada a declaração de rescisão indireta. Comporta reparos o decidido. Na petição inicial o reclamante formulou o pedido em questão sob os seguintes fundamentos: foi admitido aos serviços da Reclamada em 07/07/2017, para exercer a função de motorista (doc. 04). Ocorre que o empregador começou a descumprir algumas de suas obrigações contratuais, razão pela qual se tornou impossível para o Autor a manutenção no emprego, por isso pleiteia agora a rescisão indireta de seu pacto laboral". Afirmou que a ré não pagou o vale refeição do mês de março/2019, que não usufruía do intervalo intrajornada, bem como que não efetuava corretamente os depósitos de FGTS. A reclamada negou as alegações descritas na petição inicial, exceto quanto ao FGTS, bem como afirmou que o autor foi demitido por justa causa, em 16/05/2019, por abandono de emprego. De início, consigne-se que a reclamada não insiste na tese de demissão por justa causa, requerendo, apenas, que seja convertida a rescisão contratual em pedido de demissão do autor. O contrato de trabalho é regido pelo princípio da continuidade da prestação dos serviços, ensejando assim, necessidade de comprovação robusta para casos de rescisão motivada do pacto laboral previstos no artigo 483 da CLT. A "justa causa do empregador" é caracterizada pelas atitudes do empregador que tornem a relação de emprego insustentável, levando o obreiro a considerar rescindido o contrato de trabalho de forma extraordinária e sendo devidas todas as verbas incidentes nos casos de dispensa imotivada. Neste sentido, se faz necessário que a comprovação dos atos ilícitos da reclamada sejam contundentes, demonstrando a atitude desonesta, amoral ou ofensiva por parte do empregador, apta a ensejar-lhe a "punição" máxima no curso do contrato, qual seja, a configuração da rescisão indireta. As alegadas irregularidades relativas ao atraso ou inadimplemento de verbas contratuais, no caso, não justificam a rescisão por culpa da reclamada com base no artigo 483 da CLT, sendo passíveis de correção judicial. Cabe ressaltar que a inadimplência dos depósitos do FGTS, único fundamento do pedido de reconhecimento de rescisão indireta julgado procedente, por si só, não constitui motivo justificador de rescisão indireta. Trata-se de verba que se torna disponível ao empregado apenas no momento da rescisão contratual, não tendo o condão de tornar insuportável a relação de emprego . Ademais, a r. Sentença já deferiu o pagamento dos depósitos fundiários nos períodos em que estão abertos. Reformo a r. decisão de origem a fim reconhecer que a ruptura contratual se deu por iniciativa do reclamante, como se pedido de demissão fosse, na data de 17/04/2019 (data da baixa anotada pela reclamada - Id. nº 04fb328) e excluir da condenação o pagamento do aviso prévio indenizado (33 dias) e projeções, multa de 40% sobre o FGTS, bem como a liberação das guias para levantamento do FGTS e recebimento do seguro desemprego, devendo o pagamento do 13º salário no importe de 4/12 e férias + 1/3 proporcionais ser no importe de 9/12. As diferenças de saldo do FGTS (8%) deverão ser depositadas na conta vinculada do autor".(destaquei ). " (destaques no original)

Ao exame.

Extrai-se do trecho transcrito pelo reclamante no recurso de revista que, apesar do não recolhimento dos depósitos do FGTS ao longo da contratualidade, o TRT concluiu que tal fato não configura causa suficiente para considerar que houve rescisão indireta do contrato de trabalho do reclamante.

Contudo, nos termos da jurisprudência desta Corte, o descumprimento de obrigação essencial ao emprego, tal como não depositar o FGTS, justifica a rescisão indireta, nos termos do artigo 483, alínea "d", da CLT.

Nesse sentido, citem-se os seguintes julgados da SBDI-1 e de Turmas do TST:

"RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 11.496/2007. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DO FGTS E DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ARTIGO 483 DA CLT . O artigo 483, d, da CLT faculta ao empregado, no caso de descumprimento das obrigações contratuais por parte do empregador, a rescisão indireta do contrato de trabalho. Nesse sentido, o fato de não recolher os depósitos do FGTS, ou seu recolhimento irregular, e das contribuições previdenciárias, configura ato faltoso do empregador, cuja gravidade é suficiente para acarretar a rescisão indireta do contrato de trabalho . Por outro lado, esta Corte tem reiteradamente decidido pela relativização do requisito da imediatidade no tocante à rescisão indireta, em observância aos princípios da continuidade da prestação laboral e da proteção ao hipossuficiente. O artigo 483, caput e § 3º, da CLT, faculta ao empregado considerar rescindido o contrato de trabalho antes de pleitear em juízo as verbas decorrentes da rescisão indireta. Todavia, o referido dispositivo não estabelece o procedimento a ser adotado pelo empregado quando o empregador incidir em uma das hipóteses de justa causa. Vale dizer, não há qualquer exigência formal para o exercício da opção de se afastar do emprego antes do ajuizamento da respectiva ação trabalhista. Comprovada em juízo a justa causa do empregador, presume-se a relação entre a falta patronal e a iniciativa do empregado de rescindir o contrato de trabalho. Esse é o entendimento assente na jurisprudência majoritária desta Corte Superior, em julgados da Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais, bem como das Turmas, é no sentido de que a ausência de recolhimento de valores devidos a título de FGTS , por parte do empregador , no curso do contrato de trabalho autoriza a rescisão indireta. E esse entendimento ampara-se justamente no artigo 483, d , da CLT, segundo o qual o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando o empregador não cumprir as obrigações do contrato. Recurso de embargos conhecido e não provido " (E-ED-ED-RR-1902-80.2010.5.02.0058, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 10/03/2017).

"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI N.º13.467/2017 . RESCISÃO INDIRETA. IRREGULARIEDADES NO RECOLHIMENTO DO FGTS . Hipótese em que o Tribunal Regional não reconheceu a rescisão indireta pelo fato de a reclamada não proceder aos depósitos referentes ao FGTS na conta vinculada da reclamante. Tal decisão é dissonante da jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de que a ausência de recolhimento dos depósitos do FGTS, ou seu recolhimento irregular, configura ato faltoso do empregador suficientemente grave para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos da alínea "d" do art. 483 da CLT. Precedentes . Recurso de revista conhecido e provido " (RR-1000248-52.2017.5.02.0363, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 23/10/2020).

"RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA. IRREGULARIDADES NOS RECOLHIMENTOS DO FGTS. POSSIBILIDADE. A jurisprudência desta Corte considera que a ausência do recolhimento dos depósitos do FGTS ou seu recolhimento irregular constitui falta grave do empregador, suficiente a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho na forma que possibilita o art. 483, alínea "d", da CLT. Recurso de Revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-529-78.2014.5.09.0672, 8ª Turma, Relator Ministro Joao Batista Brito Pereira, DEJT 14/08/2020).

"RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE. APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/14 E DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST E ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. RECOLHIMENTO IRREGULAR DO FGTS E A NÃO CONCESSÃO DE INTERVALO INTRAJORNADA. RESCISÃO INDIRETA. CABIMENTO. 1 - A falta de recolhimento dos depósitos do FGTS (ou seu recolhimento irregular) e também a não concessão de intervalo intrajornada configuram atos faltosos do empregador, cuja gravidade é suficiente para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, d , da CLT. Julgados. 2 - Recurso de revista a que se dá provimento" (RR-747-09.2014.5.02.0056, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 16/08/2019).

"(...) RESCISÃO INDIRETA. CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DOS DEPÓSITOS DO FGTS. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DECORRENTE DO CONTRATO DE TRABALHO. 1. O Tribunal Regional reformou a sentença, por meio da qual se reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho. Compreendeu o Colegiado de origem que "o eventual atraso nos depósitos do FGTS, ainda que se configure descumprimento contratual, não se reveste de gravidade capaz de impedir a continuidade da relação de emprego, sendo que ainda poderia a trabalhadora postular judicialmente o cumprimento da obrigação patronal, sem que houvesse a resilição contratual" . 2. Contudo, a jurisprudência deste Tribunal Superior é pacífica no sentido de que a ausência de recolhimento dos depósitos do FGTS, ou seu recolhimento irregular, por si só, configura ato faltoso do empregador cuja gravidade é suficiente para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Precedentes. 3. Violação ao artigo 483, "d", da CLT que se reconhece. Recurso de revista conhecido e provido, no tema. (, 1ª Turma. Relator Ministro: Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 24/05/2019);

"(...) RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. FALTA GRAVE DO EMPREGADOR. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DO FGTS. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a ausência de recolhimentos dos depósitos de FGTS configura conduta grave a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho . II. Recurso de revista de que se conhece, por violação do art. 483, "d", da CLT, e a que se dá provimento." (, 4ª Turma, Relator Ministro: Alexandre Luiz Ramos, DEJT 10/05/2019);

Os julgados citados trazem teses que levam em conta situações similares à examinada no caso concreto, demonstrando o entendimento desta Corte Superior sobre a matéria, o qual também deve ser aplicado neste processo.

Pelo exposto, dou provimento ao agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso de revista, para melhor exame da apontada violação do artigo 483, alínea "d", da CLT.

II - RECURSO DE REVISTA

CONHECIMENTO

RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. NÃO RECOLHIMENTOS DE DEPÓSITOS DE FGTS.

A fim de demonstrar o prequestionamento da matéria controvertida, a parte indicou, nas razões do recurso de revista (fls. 402-404), o seguinte excerto do acórdão do TRT:

"Da Rescisão Indireta. Não se conforma a reclamada a declaração de rescisão indireta. Comporta reparos o decidido. Na petição inicial o reclamante formulou o pedido em questão sob os seguintes fundamentos: foi admitido aos serviços da Reclamada em 07/07/2017, para exercer a função de motorista (doc. 04). Ocorre que o empregador começou a descumprir algumas de suas obrigações contratuais, razão pela qual se tornou impossível para o Autor a manutenção no emprego, por isso pleiteia agora a rescisão indireta de seu pacto laboral". Afirmou que a ré não pagou o vale refeição do mês de março/2019, que não usufruía do intervalo intrajornada, bem como que não efetuava corretamente os depósitos de FGTS. A reclamada negou as alegações descritas na petição inicial, exceto quanto ao FGTS, bem como afirmou que o autor foi demitido por justa causa, em 16/05/2019, por abandono de emprego. De início, consigne-se que a reclamada não insiste na tese de demissão por justa causa, requerendo, apenas, que seja convertida a rescisão contratual em pedido de demissão do autor. O contrato de trabalho é regido pelo princípio da continuidade da prestação dos serviços, ensejando assim, necessidade de comprovação robusta para casos de rescisão motivada do pacto laboral previstos no artigo 483 da CLT. A "justa causa do empregador" é caracterizada pelas atitudes do empregador que tornem a relação de emprego insustentável, levando o obreiro a considerar rescindido o contrato de trabalho de forma extraordinária e sendo devidas todas as verbas incidentes nos casos de dispensa imotivada. Neste sentido, se faz necessário que a comprovação dos atos ilícitos da reclamada sejam contundentes, demonstrando a atitude desonesta, amoral ou ofensiva por parte do empregador, apta a ensejar-lhe a "punição" máxima no curso do contrato, qual seja, a configuração da rescisão indireta. As alegadas irregularidades relativas ao atraso ou inadimplemento de verbas contratuais, no caso, não justificam a rescisão por culpa da reclamada com base no artigo 483 da CLT, sendo passíveis de correção judicial. Cabe ressaltar que a inadimplência dos depósitos do FGTS, único fundamento do pedido de reconhecimento de rescisão indireta julgado procedente, por si só, não constitui motivo justificador de rescisão indireta. Trata-se de verba que se torna disponível ao empregado apenas no momento da rescisão contratual, não tendo o condão de tornar insuportável a relação de emprego . Ademais, a r. Sentença já deferiu o pagamento dos depósitos fundiários nos períodos em que estão abertos. Reformo a r. decisão de origem a fim reconhecer que a ruptura contratual se deu por iniciativa do reclamante, como se pedido de demissão fosse, na data de 17/04/2019 (data da baixa anotada pela reclamada - Id. nº 04fb328) e excluir da condenação o pagamento do aviso prévio indenizado (33 dias) e projeções, multa de 40% sobre o FGTS, bem como a liberação das guias para levantamento do FGTS e recebimento do seguro desemprego, devendo o pagamento do 13º salário no importe de 4/12 e férias + 1/3 proporcionais ser no importe de 9/12. As diferenças de saldo do FGTS (8%) deverão ser depositadas na conta vinculada do autor".(destaquei ). " (destaques no original)

Nas razões em exame, o reclamante sustenta que o fato de a reclamada não ter efetuado o recolhimento dos depósitos do FGTS em conta vinculada nos últimos 9 meses do pacto laboral acarretou a rescisão indireta do contrato, sendo devidas pela recorrida todas as verbas contratuais e rescisórias decorrentes da dispensa sem justa causa. Indica ofensa aos artigos 7º, inciso III, da Constituição da República e 483, "d", da CLT, bem como transcreve arestos para o confronto de teses.

Ao exame.

Extrai-se do trecho transcrito pelo reclamante no recurso de revista que, apesar do não recolhimento dos depósitos do FGTS ao longo da contratualidade, o TRT concluiu que tal fato não configura causa suficiente para considerar que houve rescisão indireta do contrato de trabalho do reclamante.

Contudo, nos termos da jurisprudência desta Corte, o descumprimento de obrigação essencial ao emprego, tal como não depositar o FGTS, justifica a rescisão indireta, nos termos do artigo 483, alínea "d", da CLT.

Nesse sentido, citem-se os seguintes julgados da SBDI-1 e de Turmas do TST:

"RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 11.496/2007. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DO FGTS E DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ARTIGO 483 DA CLT . O artigo 483, d, da CLT faculta ao empregado, no caso de descumprimento das obrigações contratuais por parte do empregador, a rescisão indireta do contrato de trabalho. Nesse sentido, o fato de não recolher os depósitos do FGTS, ou seu recolhimento irregular, e das contribuições previdenciárias, configura ato faltoso do empregador, cuja gravidade é suficiente para acarretar a rescisão indireta do contrato de trabalho . Por outro lado, esta Corte tem reiteradamente decidido pela relativização do requisito da imediatidade no tocante à rescisão indireta, em observância aos princípios da continuidade da prestação laboral e da proteção ao hipossuficiente. O artigo 483, caput e § 3º, da CLT, faculta ao empregado considerar rescindido o contrato de trabalho antes de pleitear em juízo as verbas decorrentes da rescisão indireta. Todavia, o referido dispositivo não estabelece o procedimento a ser adotado pelo empregado quando o empregador incidir em uma das hipóteses de justa causa. Vale dizer, não há qualquer exigência formal para o exercício da opção de se afastar do emprego antes do ajuizamento da respectiva ação trabalhista. Comprovada em juízo a justa causa do empregador, presume-se a relação entre a falta patronal e a iniciativa do empregado de rescindir o contrato de trabalho. Esse é o entendimento assente na jurisprudência majoritária desta Corte Superior, em julgados da Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais, bem como das Turmas, é no sentido de que a ausência de recolhimento de valores devidos a título de FGTS , por parte do empregador , no curso do contrato de trabalho autoriza a rescisão indireta. E esse entendimento ampara-se justamente no artigo 483, d , da CLT, segundo o qual o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando o empregador não cumprir as obrigações do contrato. Recurso de embargos conhecido e não provido " (E-ED-ED-RR-1902-80.2010.5.02.0058, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 10/03/2017).

"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI N.º13.467/2017 . RESCISÃO INDIRETA. IRREGULARIEDADES NO RECOLHIMENTO DO FGTS . Hipótese em que o Tribunal Regional não reconheceu a rescisão indireta pelo fato de a reclamada não proceder aos depósitos referentes ao FGTS na conta vinculada da reclamante. Tal decisão é dissonante da jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de que a ausência de recolhimento dos depósitos do FGTS, ou seu recolhimento irregular, configura ato faltoso do empregador suficientemente grave para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos da alínea "d" do art. 483 da CLT. Precedentes . Recurso de revista conhecido e provido " (RR-1000248-52.2017.5.02.0363, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 23/10/2020).

"RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA. IRREGULARIDADES NOS RECOLHIMENTOS DO FGTS. POSSIBILIDADE. A jurisprudência desta Corte considera que a ausência do recolhimento dos depósitos do FGTS ou seu recolhimento irregular constitui falta grave do empregador, suficiente a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho na forma que possibilita o art. 483, alínea "d", da CLT. Recurso de Revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-529-78.2014.5.09.0672, 8ª Turma, Relator Ministro Joao Batista Brito Pereira, DEJT 14/08/2020).

"RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE. APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/14 E DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST E ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. RECOLHIMENTO IRREGULAR DO FGTS E A NÃO CONCESSÃO DE INTERVALO INTRAJORNADA. RESCISÃO INDIRETA. CABIMENTO. 1 - A falta de recolhimento dos depósitos do FGTS (ou seu recolhimento irregular) e também a não concessão de intervalo intrajornada configuram atos faltosos do empregador, cuja gravidade é suficiente para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, d , da CLT. Julgados. 2 - Recurso de revista a que se dá provimento" (RR-747-09.2014.5.02.0056, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 16/08/2019).

"(...) RESCISÃO INDIRETA. CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DOS DEPÓSITOS DO FGTS. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DECORRENTE DO CONTRATO DE TRABALHO. 1. O Tribunal Regional reformou a sentença, por meio da qual se reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho. Compreendeu o Colegiado de origem que "o eventual atraso nos depósitos do FGTS, ainda que se configure descumprimento contratual, não se reveste de gravidade capaz de impedir a continuidade da relação de emprego, sendo que ainda poderia a trabalhadora postular judicialmente o cumprimento da obrigação patronal, sem que houvesse a resilição contratual" . 2. Contudo, a jurisprudência deste Tribunal Superior é pacífica no sentido de que a ausência de recolhimento dos depósitos do FGTS, ou seu recolhimento irregular, por si só, configura ato faltoso do empregador cuja gravidade é suficiente para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Precedentes. 3. Violação ao artigo 483, "d", da CLT que se reconhece. Recurso de revista conhecido e provido, no tema. (, 1ª Turma. Relator Ministro: Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 24/05/2019);

"(...) RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. FALTA GRAVE DO EMPREGADOR. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DO FGTS. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a ausência de recolhimentos dos depósitos de FGTS configura conduta grave a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho . II. Recurso de revista de que se conhece, por violação do art. 483, "d", da CLT, e a que se dá provimento." (, 4ª Turma, Relator Ministro: Alexandre Luiz Ramos, DEJT 10/05/2019);

Os julgados citados trazem teses que levam em conta situações similares à examinada no caso concreto, demonstrando o entendimento desta Corte Superior sobre a matéria, o qual também deve ser aplicado neste processo.

Por essas razões, conheço do recurso de revista, por violação ao artigo 483, alínea "d", da CLT.

MÉRITO

RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. NÃO RECOLHIMENTOS DE DEPÓSITOS DE FGTS.

Como consequência do conhecimento do recurso de revista, por violação do artigo 483, alínea "d", da CLT, dou-lhe provimento para, restabelecendo a sentença, reconhecer a rescisão indireta do contrato de trabalho, com o pagamento das verbas rescisórias correspondentes postuladas na inicial (inclusive entrega das guias ou indenização do seguro desemprego) e as repercussões legais daí decorrentes, conforme se apurar em liquidação. Invertido o ônus da sucumbência em relação às custas de R$ 400,00 (quatrocentos reais), calculadas sobre o valor provisório da condenação arbitrado na sentença em R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – reconhecer a transcendência e dar provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista quanto ao tema " RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. NÃO RECOLHIMENTOS DE DEPÓSITOS DE FGTS " ; II - conhecer do recurso de revista por violação do artigo 483, alínea "d", da CLT, e, no mérito, dar-lhe provimento para, restabelecendo a sentença, reconhecer a rescisão indireta do contrato de trabalho, com o pagamento das verbas rescisórias correspondentes postuladas na inicial (inclusive entrega das guias ou indenização do seguro desemprego) e as repercussões legais daí decorrentes, conforme se apurar em liquidação. Invertido o ônus da sucumbência em relação às custas de R$ 400,00 (quatrocentos reais), calculadas sobre o valor provisório da condenação arbitrado na sentença em R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

Brasília, 24 de fevereiro de 2021.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

KÁTIA MAGALHÃES ARRUDA

Ministra Relatora